terça-feira, 21 de abril de 2015

"Divertimento", "Desastre (Outro Postal)"


Divertimento

Suponha então que seja este o meu último poema
(imagine, na carniça da idade) olho
para o seu rosto, não sei se se refere ao infinito,
que é isto quando
os olhos descrevem uma argola e depois outra,
quando manobra – mas por quê? – os óculos
na vertical,
não sei,
ignoro o número oito.
Suponha agora que sejam estas as minhas últimas palavras.
Não “Josefina” –, “mais luz!” –,
já faz muito tempo que não bebo champanhe”, mas
estas:
“Ignoro o número oito”.

(Neste exato momento um piano caminha lentamente para a Terra).

*

Desastre (Outro Postal)

Este o seu rosto comprido quando o outono entrava
colhia-se um cheiro a peixe
este o seu rosto a oscilar com os números oficiais
toneladas de peixes carregados em caminhões de noite
                                                       aos outeiros da periferia

este o seu rosto estampando-se asfáltica água
montanhas trançadas
aquilo que não ejaculava, transparente?

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