sexta-feira, 11 de julho de 2014

“Não tem por onde se lhe pegue”


Trabalho num edifício do governo
fronteiro há
um jardim do governo
onde aleias do governo

caramanchões do governo
sob os quais
namorados do governo
cantam o caput
do contrato remiram firmes
reivindicativas flores
onde
abelhas há
que rebentam
rebentam de apólices
duvidosas
onde há velhos onde
cerram-se
rijas enfermeiras do governo
para que não se tornem
das mesmas carpas
que as crianças
chutam
seixos cercas estacas
formigueiros há
onde
atiraram-se ofícios acesos
há polícias bom
não são mais do que os rigores
do lugar
dentre os quais
uma planície sustentada
por enferrujadas mãos
francesas
já não se conta nada
de propriamente meu tirante
umas duas trombas
d’água
(uma à entrada
outra pontualmente
mais adiante)
mais essa diabólica
inflamação
das bolsas sinoviais
até mesmo a bengala
tomei-a de empréstimo
a uma amiga
cuja mãe –
                 & agora
amparo-a contra
um coqueiro do governo
um pouco penso
à laje das coisas
rebusco os bolsos
onde os cigarros
onde o isqueiro
onde as migalhas
& minhas mãos (tremem
imperceptivelmente)
cogito de todos os homens
que morreram à procura
de sombra
não terás sido
Saturnino
(não são mais)
Saturnino
(do que os rigores)
Saturnino
(do lugar)
Saturnino
o mais
o mais
[...]
poupado?
                        quisera
pôr em tudo
que fiz uma cidade
uma ameaça
uma mal
-pronunciada oubliette
mas
minhas mãos tremem
imperceptivelmente
sobre o cilindro cinzeiro seguro
terei o aspecto de quem
acaba de perder uma vogal importantíssima
como “a” ou
o quanto antes
rezar um léxicon
na intenção destas senhoras de jaleco branco
sem comboio de colírio
ou lencinho alavandado
parecem extraviadas de longo jejum
tomam
distraidamente
por uma língua morta
& de dentro
               gritando
                            fogo
& de dentro
               gritando
                            fogo
(já não parece
que foi ontem)
fizemos soar
as alarmas de incêndio
nada disso companheiros
é culpa minha

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